Peter Docter, vencedor de trĂȘs Oscars de Melhor Filme de Animação por Up: Altas Aventuras (2009), Divertida Mente (2016) e Soul (2021) anda pressionado e, podemos dizer, ansioso. âSe Divertida Mente 2 nĂŁo for bem no cinema, acho que significa que teremos que pensar mais radicalmente como fazemos nossos negĂłciosâ, disse recentemente em uma entrevista para a revista Time. Â
Depois de produçÔes irregulares da Pixar, como Red: Crescer Ă© uma Fera (2022), Lightyear (2022) e Elementos (2023), Divertida Mente 2, a sequĂȘncia do estrondoso sucesso que desde semana ada estĂĄ nos cinemas brasileiros, precisa dar certo.Â
Dirigido por Kelsey Mann, a histĂłria se a alguns anos depois do primeiro filme. Riley, a protagonista, chega na puberdade, que entra em sua cabeça disparando um alerta vermelho, atropelando os personagens que representam os respectivos sentimentos Alegria, Medo, Raiva, Tristeza e Nojinho. EmoçÔes que estavam em pleno funcionamento, depois que o primeiro filme costurou habilmente o papel de cada uma. Para virar uma adolescente, Riley terĂĄ que lidar com novas emoçÔes, muito familiares aos nossos tempos, e nĂŁo sĂł para crianças: Ansiedade, TĂ©dio, Vergonha e Inveja.Â
Reprimidas, as emoçÔes anteriores percorrem os abismos da consciĂȘncia, enquanto a Ansiedade toma a torre de comando. O roteiro funciona de maneira muito semelhante ao primeiro (o filme tem a mesma duração), o que traz virtudes e defeitos.Â
A Ansiedade guia as atitudes de Riley e, aparentemente, parece ajudĂĄ-la. Ela se destaca no Hockey e se torna amiga das meninas mais velhas, por quem tem iração e, tambĂ©m, inveja. O mecanismo de desenvolvimento da sua personalidade Ă© basicamente ir atrĂĄs do que quer, a um custo que sĂł percebe mais tarde. Â
O TĂ©dio a ajuda a encontrar as soluçÔes menos desgastantes possĂveis, como responder seus pais de forma monossilĂĄbica, algo tipicamente adolescente. JĂĄ a Vergonha surge quando todas essas coisas vĂŁo longe demais. Â
TatĂĄ Werneck dubla a Ansiedade e os brasileiros tĂȘm o privilĂ©gio dessa excelente interpretação, jĂĄ que a personagem tem falas em excesso, que se tornam repetitivas â algo bem ao estilo da atriz. As emoçÔes da adolescĂȘncia sĂŁo mais complexas e mereciam um tratamento mais cuidadoso. A mais interessante, o TĂ©dio, que parece um beatnik francĂȘs (o movimento artĂstico contracultura que marcou a dĂ©cada de 50), infelizmente participa pouco.Â
A carta na manga da Pixar 24b48
PorĂ©m, como no primeiro filme, hĂĄ momentos muito divertidos na sequĂȘncia de Divertida Mente, especialmente aqueles proporcionados pela Raiva e por novos personagens, como o que logo cai no gosto da sala de cinema toda: a âPocheteâ. Â
O espectador tambĂ©m tem a agradĂĄvel sensação de âeu sei o que Ă© issoâ, muito Ăștil para tratar emoçÔes e uma clara maneira de induzir o pĂșblico pelas nuances da inteligĂȘncia emocional. Outra qualidade sĂŁo as imagens usadas para representar fenĂŽmenos complexos como fluxo de consciĂȘncia, as memĂłrias rejeitadas, assim como outros mais simples, a exemplo do sarcasmo e do âtorĂł de ideiasâ â o famoso brainstorm.
E a cereja do bolo fica para o final, lembrando aos fãs da franquia que vale ficar mais um tempo no cinema para ser recompensado com as saborosas cenas pós-créditos. Como uma sobremesa depois de um divertido jantar, as torres de comando tomam conta da telona e arrancam risos até a tela ficar toda preta. Os roteiristas deitam e rolam, assim como a plateia.
No final das contas, Divertida Mente 2 Ă© satisfatĂłrio e a Pixar parece ter enfrentado bem o desafio que Docter deixou pĂșblico. Depois de produçÔes originais, tendo como auge o comovente Soul, a produtora apostou na franquia que deixou espectadores ĂłrfĂŁos e sedentos pela tĂŁo esperada sequĂȘncia. Talvez, buscando pisar no chĂŁo, reproduziu em boa parte o modelo do primeiro filme, querendo recuperar a confiança para novas produçÔes.Â
O próximo grande o talvez venha com uma série, a ser exibida no Disney +, que Docter jå sugeriu que deve acontecer. à excitante a possibilidade de explorar cenårios como a Produção de Sonhos, ou trazer de volta o saudoso personagem Bing Bong, o amigo imaginårio da protagonista deixado no subconsciente na primeira versão do filme.
Ainda, um possĂvel Inside Out 3 (titulo original do filme em inglĂȘs) fica na manga da Pixar, para explorar a vida adulta e trazer o arrependimento, a culpa, a autorrealização e, quem sabe, atĂ© a consciĂȘncia da mortalidade.Â
Fonte: gazetadopovo